terça-feira, abril 04, 2006

A OPA da Sonae: O retalho da PT?

As empresas nascem, crescem, vivem e morrem, tal como acontece na vida das pessoas. Porém, o nascimento da PT, em 1994, resultou da fusão de três grandes empresas – ex-TP, ex-TLP e ex-Marconi – com o claro objectivo de fortalecer e desenvolver o dinâmico mercado das telecomunicações, cujo contributo para a modernização do tecido económico português é reconhecidamente inquestionável. Por outro lado, a criação da PT permitiu à Bolsa de Valores ganhar dimensão e escala, na medida em que as 5 fases de privatização dinamizaram fortemente o anémico mercado bolsista de então, sem olvidar que o Estado ao privatizar a PT obteve um sexto do total das receitas com as privatizações, contribuindo, desse modo, para reduzir a elevada divida pública, tendo em vista o cumprimento de um dos critérios da entrada na moeda única – o EURO.

A PT, na proposta de OPA (Oferta Pública de Aquisição) da Sonae, vale 16 mil milhões de euros, quase 10% do PIB, sendo a maior empresa nacional cotada na bolsa, significa que a mesma não poderá ser vendida a retalho, isto é, a oferente pretende comprar a PT com o “pelo do cão”, implicando o vencimento de tal proposta um menor esforço financeiro do grupo empresarial português. A meu ver, é de louvar a atitude da Sonae, no actual contexto da economia nacional, porquanto revela confiança na nossa economia e, obviamente, na própria PT. Contudo, a PT não pode, nem deve, ser considerada uma empresa qualquer na expressão quantitativa e qualitativa da economia portuguesa, já que o seu percurso e desempenho deve ser orientado para a promoção do progresso tecnológico e para o consequente desenvolvimento económico do país. A PT é uma empresa de ponta no domínio das novas tecnologias, com fortes ligações aos meios académicos e científicos portugueses, com capacidade de inovação própria (PT/Inovação) e reconhecimento internacional (caso dos cartões pré-pagos nos telemóveis). Assim, a PT é uma empresa estruturante das novas condições produtivas, nomeadamente no desenvolvimento do Plano Tecnológico que o actual Governo pretende implementar de forma acelerada, para vencermos o nosso atraso económico.

Ao estar cotada na Bolsa de Nova Iorque a PT dignifica a imagem de Portugal – a única empresa de bandeira - no estrangeiro, quer pela sua reconhecida qualidade, quer pelos seus bons resultados económicos, apesar da forte concorrência e da pressão das entidades reguladoras nacionais. A PT representa 4% do PIB nacional, 1% do emprego e 500 milhões de euros/ano de investimento (é o maior investidor privado português). Aliás, refira-se que existem quatro aspectos, de primordial importância, que a OPA ainda não esclareceu, como sejam: - qual o futuro do Fundo de Pensões da PT, sendo certo que apresenta um “buraco” de 2.500 milhões de euros (500 milhões de contos), resultantes de obrigações não fundeadas pela empresa (?); - qual o futuro da PT/ACS que serve cerca de 100.000 beneficiários (?); - qual o futuro dos cerca de 4.000 trabalhadores a “dispensar” na PT, bem como dos seus direitos? e - que futuro está reservado à PT/Inovação, no contexto da necessidade de I&D que o país carece(?). Daí que a relevância da PT na sociedade portuguesa, no contexto da feroz competição no mercado internacional das telecomunicações, venha a determinar uma atenção especial do Governo para esta OPA, na medida em lhe caberá, em última instância, a salvaguarda do interesse nacional num agressivo mercado em consolidação. Assim, a chave para a solução desta operação está nas mãos do Governo, depois das entidades reguladoras se pronunciarem, nos termos legais.